Do que a federação1 gosta?
É difícil sintetizar o que um grupo que apesar de pequeno mas muito heterogêneo deve gostar. Por muito, a piada foi que, pelo menos entre a comunidade brasileira, a federação se resumia em “Café, Linux e Cu”. Deixando a fase anal de lado, é fácil entender por que usuários de uma rede aberta, federada e auto-hospedada iriam se interessar por Linux — ou vice-versa. Sobre o café, bem, todo mundo gosta de café.
Acho que há mais o que se explorar nos gostos desta comunidade que no fim é um caroço de uma IndieWeb efervescente em meio a uma internet arrasada. Talvez a palavra de ordem seja justamente Indie — Independente. A federação gosta do que é independente e artesanal porque assim ela é — Servidores caseiros, instâncias custeadas coletivamente, Software Livre feito por nerds entusiastas. A federação é independente, artesanal, humana e além de tudo marginal, ou como um usuário a definiria, uma “Web Favela”. Nela se propaga tudo aquilo que é demasiado humano, vivências e histórias, colóquio e troça, luta e subversão. Morre tudo que é publicitário, tudo o que é marketing pessoal, tudo que se apresenta como produto. Não à toa não há algoritmos, publicidade ou coleta de dados.
A abertura das relações em um ambiente que diferente das alternativas não se constitui como um panóptico digital ou um shopping permite a criação de comunidades reais que se distanciam das famigeradas Brand Comunities. Enquanto em redes algoritmizadas condicionadas por um reforço positivo o usuário se encontra cada vez mais preso em bolhas, nas redes federadas o singular floresce no comércio comum de uma comunidade — O shopping se converte em praça. Singular é outra palavra chave, a falta de um algoritmo que conduz artificialmente o que é visível e a presença de de comunidades plurais permite que a federação propagandeie excentricidades que não seriam reconhecidas por um algoritmo. Em poucos minutos você encontra sites curiosos como um museu de fitas cassetes , blogs não convencionais como um blog inteiro sobre Dungeon Synth , vídeos curiosos como a história das cuecas, notícias únicas como o mapeamento de mais de 90 espécies em um parque de Minas . As paixões, por mais excêntricas, encontrarão conexões.
Por fim, é importante entender a federação como um amontoado de comunidades marginais ou nichadas. Anarquistas a urbanistas, furries a metaleiros, Queers a ativistas do clima, neurodivergentes a comunistas, PCDs a hacktivistas. Isso significa que ao contrário de outras redes a federação também prestigia aquilo que é subversivo ou fora do mainstream. Posts pró-Palestina, graffitis antifascistas, denúncias contra nazis, textos anti-IA, publicações anti carros, notícias populares.
Isso nos responde, pelo menos em parte, o que a federação agracia — Tudo aquilo que é Independente, singular, subversivo e ou underground. Não que as normalidades fiquem de fora, pelo contrário, lá sempre estarão as piadas sobre ainda ser quarta-feira, memes em baixa resolução, fotos de gatos, as tendências da semana e todo bate-papo convencional. O fato é que nenhum tópico domina a rede só porque agrada a um algoritmo. Mas se precisasse definir essa comunidade em poucas palavras seriam essas três: Independente, Singular e Subversivo.
Footnotes
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Redes sociais descentralizadas, federadas e interoperáveis como Mastodon, PixelFed e Lemmy. Comumente chamados de Fediverse. ↩